terça-feira, 2 de agosto de 2011

Alguns discentes da UFRB querem garantir suas matrículas 2011.2 e, consequentemente, não querem aula.

Este texto é fruto da minha indignação com um movimento que está sendo divulgado na rede social do Facebook, o Matrícula já! Estudante não é palhaço! cujo objetivo é uma manifestação para reivindicar a matrícula estudantil do semestre 2011.2.

Os servidores técnico-administrativos da UFRB encontram-se em greve assim como os seus pares da UFBA. Motivos justos não faltam. Vide a Carta Aberta À População. Dessa forma, estando os técnico-administrativos em greve, não é possível o funcionamento da Universidade – digo em termos de normalidade. Afinal, qual seria o sentido de uma greve em uma instituição se a mesma permitisse o caminhar normal das coisas? Depois, poderíamos até questionar a necessidade de servidores se a ausência dos mesmos não privasse a Universidade do seu modus operandi. Os rituais acadêmicos como todos os rituais, precisam ser reiterados constantemente. E a Universidade opera através da burocracia e esta só se constitui com todas as peças presentes. Bom, mas continuemos.

Até onde eu entendi, alguns estudantes da UFRB pretendem uma manifestação que busque “providências referentes à matrícula do semestre 2011.2” a fim de que tenhamos as aulas do semestre garantidas. Ainda afirmam que a Manifestação deve levar em conta as considerações da greve não se posicionando contrária a mesma. Por fim, defendem a continuidade da greve, dada a sua relevância, desde quando a matrícula seja garantida e, consequentemente, as aulas aconteçam. Para mim, todo esse posicionamento é problemático, começando pelo nome da própria Manifestação.

Afirmar que estudante não é palhaço porque a matrícula está demorando de acontecer chega a ser uma atitude infeliz. Primeiro, o circo existe há tempos e os espetáculos expropriam direitos bem maiores que os da matrícula. Talvez a greve deste momento seja uma boa oportunidade pra que ele, o circo, pegue fogo. E talvez nós, estudantes, estejamos mais na condição de plateia que de palhaços.

Depois, a matrícula até onde sei, diz respeito àquela burocracia aludida anteriormente. Portanto, em estado de greve, ela também não deve funcionar. Reivindicar por ela pode ser interpretado como um ato de individualismo, tendo em vista que a greve em questão alia interesses não apenas da categoria dos servidores, mas também dos cidadãos, um exemplo é o reclame pela não privatização dos hospitais universitários.

De fato, os interesses entre as categorias têm se individualizado. Não há uma orientação comum pela coisa pública. O que pode ser a causa, inclusive, do distanciamento entre servidores e discentes e a comunicação capenga entre ambos. Apenas ontem, 1º de agosto, recebi a Carta Aberta Aos Estudantes. E aqui reafirmo: falta a busca e também a divulgação de informações sobre a greve.

Mas, o que de fato me indigna não é tanto a tentativa de furo da greve. É a compreensão do papel do discente de uma Universidade Pública existente por trás de tal Manifestação. Querer a matrícula simplesmente para garantir aulas é ter uma visão simplista do nosso processo de formação (já deformado). Parece-me que a visão que se tem da Universidade é a de meramente um espaço de profissionalização. Visão que se conforma ao não entendimento de que um estudante de uma universidade pública tem uma função social e política. O que estudamos não deve ser apenas para formar nosso currículo e para construir uma carreira profissional: deve ser de interesse da sociedade. E aí cabe ver se, inclusive, aquilo que a Universidade entende como interesse social é de fato interesse social e não interesse do mercado. 

Continuando os servidores em greve, mesmo após a matrícula, como vamos garantir a funcionalidade das aulas se os mesmos são partes extremamente necessárias para o bom funcionamento daquelas? Aulões? Como funcionarão os projetos de pesquisa e extensão? (Aliás, como têm funcionado?). 

Estudante de uma Universidade Pública apenas assiste aula? E qual o entendimento de aula pressuposto na Manifestação Matrícula já! Estudante não é palhaço!? Para mim, aula no sentido menos significativo possível: garantir conhecimentos imediatos para a imediata formação profissional. "Matrícula já!". Parece que estamos aceitando passivamente a condição de operadores de máquinas que produzem mão-de-obra qualificada e de forma massificada. Estamos nos reduzindo a um funcionamento mecânico. Estamos nos privando de uma condição viva e crítica.

Eu recebi o convite para a Manifestação na minha página do Facebook. Li o conteúdo da página. Mas me abstive em postar qualquer coisa na página bem como me posicionar na discussão, isto porque não me senti atraída pela chamada da Manifestação. No mais, aqui estou valendo do meu direito de opinião  acerca de um evento público e que diz respeito à categoria da qual faço parte, a estudantil.

domingo, 1 de maio de 2011

Dia do/a Trabalhador/a

A fim de problematizar o que vem a represetar o dia 1º de Maio - o Dia do Trabalho, ou de forma mais justa, o dia do/a Trabalhador/a, postarei aqui dois artigos ralacionados à temática.

O primeiro, de autoria de Emílio Gennari, trago aqui pela pertinência do tema: o autor questiona o fato de a baixa auto-estima do trabalhador contemporaneo - que está imbricada com conformismo do mesmo -, ser afirmada pelo discurso de que tudo depende da realização individual, o que desloca a "origem" dos problemas sociais para a esfera privada e produz, assim, uma sociedade de individuos desacreditados e passivos.

O segundo artigo, de Íris Nery do Carmo minha miguxa pride, que analisa a condição do trabalho feminino dentro do sistema capitalista produtor de marcadorias. Aqui postarei um trecho seguido do link para download da revista Sinal De Menos#2, onde o artigo fora publicado.

Boa leitura!

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TEXTO 01

Anotações para uma reflexão sobre o conformismo do “novo” trabalhador

A sustentar a percepção de que tudo depende da capacidade de o indivíduo buscar sua realização e acreditar em suas capacidades, a baixa auto-estima começa a ser sistematicamente apontada como a origem dos problemas sociais que antes eram atribuídos a uma situação de injustiça que a sociedade reproduz pelas relações nela estabelecidas. Por Emílio Gennari
Já é parte do senso comum a idéia de que o perfil dos trabalhadores tem mudado fortemente em relação ao de duas décadas atrás. A solidariedade, a indignação e o sentimento de coletividade andam em baixa e a atuação dos dirigentes sindicais tem se tornado cada vez mais difícil.
No texto que segue, apresentamos fragmentos de uma reflexão a ser aprimorada e aprofundada. Nele, reunimos alguns elementos que permitem avançar em relação às conclusões a que chegamos na segunda edição do estudo “Da alienação à depressão – caminhos capitalistas da exploração do sofrimento”, mas que ainda demandam uma análise cuidadosa. Apesar disso, submetemos este rascunho à sua apreciação para que possa ajudar a entender melhor o momento de dificuldade vivido pelos sindicatos e demais movimentos. Boa leitura!
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Nos últimos 20 anos, as emoções ganham um lugar de destaque nas preocupações das forças que buscam moldar um consenso social capaz de levar as pessoas a melhor se adaptar às novas exigências da exploração. Para percebermos esta realidade, basta abrir as centenas de anexos que acompanham os e-mails que recebemos ou ler algum livro de auto-ajuda. Via de regra, seu conteúdo revela que a análise racional da realidade cede o lugar a impressões e idéias que dialogam com a sensibilidade das pessoas e oferecem um enfoque sentimental a aspectos do cotidiano que eram vistos como um obstáculo para a felicidade do indivíduo. Além da ausência de uma comprovação empírica consistente, chama atenção o convite a aceitar a realidade como algo natural e não como fruto de uma construção histórica que se dá a partir de determinados interesses de classe. A ordem social que serve de pano de fundo parece algo tão cotidiano, neutro, imparcial e inevitável quanto a lei da gravidade. Lutar contra ela, passa a ser visto como ilógico e sem sentido, ao passo que conviver com a ordem para aproveitar o que esta pode oferecer é apontado como um passo necessário para construir metas individuais que abram os caminhos da afirmação pessoal e da felicidade possível. O “EU” que se constrói numa mistura de aceitação do sofrimento e de esforço para superar os próprios limites sabe que tem que “ralar para subir na vida”, mas, ao mesmo tempo, começa a ler os entraves com os quais se depara como ameaça ao seu bem-estar emotivo e à auto-estima. Trata-se, portanto, de algo que passa a ser vivido cada vez mais na intimidade de um sujeito cujos critérios de análise o dobram sobre si mesmo na exata medida em que o colocam como início, meio e fim de qualquer ação a ser empreendida e o tornam incapaz de uma leitura da realidade na qual o “OUTRO” não seja somente mais um concorrente a derrotar.
A sustentar a percepção de que tudo depende da capacidade de o indivíduo buscar sua realização e acreditar em suas capacidades, a baixa auto-estima começa a ser sistematicamente apontada como a origem dos problemas sociais que antes eram atribuídos a uma situação de injustiça que a sociedade reproduz pelas relações nela estabelecidas. Desta forma, não são mais os mecanismos econômicos, políticos, sociais e culturais a gerarem e alimentarem uma realidade de pobreza, marginalização, discriminação, violência etc, mas sim a ausência no sujeito de uma atitude imprescindível ao seu desenvolvimento e à sua afirmação social: a auto-estima. Se, de um lado, a gente não escolhe o berço onde nasce, de outro, para a intelectualidade a serviço da elite, o que explica a pobreza em que você se encontra é a ausência de atitudes positivas em relação ao presente e ao futuro. Se você não acredita em você mesmo, não valoriza o seu potencial, não se dá ao trabalho de descobrir e pôr pra funcionar os talentos de que dispõe, então, não há como deixar esse berço incômodo em que o acaso o fez nascer. Trocado em miúdos, ninguém tem culpa de você ter nascido pobre, portanto, pare de se queixar, pense positivo, levante a cabeça, tente novas possibilidades, invista em você mesmo, assuma desafios, olhe para o novo, pois a responsabilidade por você continuar na condição social em que se encontra é somente sua!
A dinâmica que fortalece no sujeito esta percepção tem como base o fato inegável e natural de que qualquer situação é vivenciada de forma diferente por cada membro de um determinado grupo social. O foco, portanto, não é o grupo, e menos ainda as relações sociais a que está submetido, mas sempre e somente o indivíduo que vive de forma particular a realidade na qual está inserido. No caso da exclusão, por exemplo, vários autores colocam suas origens numa experiência de alienação, na baixa auto-estima, na passividade, na dependência, na desorientação, no medo, na raiva, na apatia, na ausência de aspirações, na falta de perspectivas ou atitudes do sujeito e na incapacidade deste se adaptar às demandas da realidade. Desta forma, a exclusão não nasceria de precisos mecanismos de exploração/acumulação no campo da economia e das relações de propriedade, mas sim nos núcleos da esfera privada que estão na base da formação de cada um de nós, entre os quais a família ganha, evidentemente, um papel de destaque. Na medida em que esta célula da vida em sociedade reproduz em cada membro uma devastação interior dos sentimentos e das emoções que torna os indivíduos incapazes de se afastarem de um comportamento anti-social, ela passa a ser responsabilizada pela incapacidade de o sujeito dar a volta por cima. A família ser pobre, portanto, não é problema nem empecilho para o desenvolvimento de atitudes positivas na vida dos seus membros desde que, como peça-chave da vida em sociedade, ela se torne capaz de levá-los a acreditar em si mesmos, no seu potencial e a lutar para vencer na vida nos moldes narrados, por exemplo, no filme “Os filhos de Francisco”. Num passe de mágica, os mecanismos da injustiça social desaparecem deixando aberto o caminho à supervalorização das atitudes individuais.
Para o desemprego, a explicação não se distancia da que acabamos de apresentar. Ninguém duvida que esta praga dos tempos atuais provoca efeitos psicológicos devastadores a ponto de levar o sujeito a um estado depressivo ou até mesmo a tirar a própria vida. Mas o problema está justamente no movimento que isola as emoções da realidade do mercado, da exploração, das pressões sociais e leva a ver os distúrbios psíquicos como resultado de emoções não trabalhadas que, por atingirem grupos sociais significativos, justificariam o fato de colocá-las na origem dos fenômenos antes desconhecidos. Na medida em que o indivíduo não sabe lidar com os sentimentos negativos que experimenta diante do desligamento da empresa, a demissão gera, involuntariamente, uma personalidade potencialmente destrutiva, responsável, em última análise, pelo mal-estar individual e social num processo que se alimentaria, portanto, não a partir de condições materiais, objetivas, do mercado e das necessidades da exploração, mas de atitudes individuais, oriundas de pessoas descontroladas e despreparadas que deixaram de acreditar em si mesmas e em seu potencial para poder recomeçar.
A passagem das motivações sociais e econômicas para os problemas da personalidade, como explicação que tende a se generalizar, tranquiliza a elite, permite-lhe continuar sua obra de embrutecimento das maiorias em função das metas que se propõe e lhe possibilita matar dois coelhos com um único golpe: de um lado, o substrato econômico, político, social e cultural acaba escondido pelo biombo de uma vontade do sujeito que tudo explica, tudo pode, tudo tem condições de realizar; de outro, a luta política, que apontava para a necessidade de superar a desigualdade econômica, a discriminação, a marginalização através de uma nova ordem social, é substituída pela decisão do indivíduo de dar a volta por cima. Vítima de uma situação pela qual se supõe que ninguém pode ser culpado (pois, como se diz, “as coisas são assim mesmo”, “é o mercado”, etc.), o “EU” só não conseguiria se reerguer e optaria por comportamentos/atitudes aberrantes apenas por um desvio de conduta alicerçado na incapacidade de administrar as emoções negativas oriundas da situação em que se encontra. Graças à mágica da presença/ausência de auto-estima, a elite, que fez, e continua produzindo, os estragos com sua exploração da classe trabalhadora, deixa o banco dos réus para assumir o papel de bem-feitora daqueles que, através de suas ações de “responsabilidade social” buscam um lugar onde se refugiar, ao passo que a vítima é relegada ao banco dos réus, pois, nesta lógica perversa, a ordem social não pode ser condenada por ser “natural” e comum a todos ao passo que só não sai do buraco quem não quer.
Para o novo conformismo, querer não é apenas poder, mas sim a atitude imprescindível para levantar, recomeçar, acreditar no sucesso, se afirmar e subir novos degraus da pirâmide social. Quando isso não ocorre, então, é porque o núcleo de onde o sujeito saiu está doente, desenvolve atitudes, relações, idéias, valores e formas de comportamento consideradas “tóxicas” para o futuro e o bem-estar individual e coletivo. Por outro lado, esta percepção da realidade faz com que o indivíduo alheio a este núcleo não se sinta responsável pelo que ocorre na sociedade. De fato, eu, que nasci numa “boa” família, como posso ter algo a ver com a família da favela da qual saiu “esse fulaninho aí”? Enquanto sujeito, o que posso fazer é agir para me resguardar de uma eventual ameaça, buscar me proteger e, obviamente, pedir que alguém faça valer meus direitos caso venha a ser atingido por uma situação desagradável. Se, como indivíduo, não tenho a menor responsabilidade na produção/reprodução das relações sociais do ambiente em que vivo, então o meu papel deve se limitar à cobrança dos meus direitos, de preferência através de um profissional competente, capaz ao menos de obter monetariamente a compensação pelos estragos produzidos na minha auto-estima e no estado de espírito forçado a passar por certo período de sofrimento.
Analisando agora o âmbito das relações de trabalho à luz desta perspectiva, é curioso perceber que as vítimas de assédio moral, por exemplo, não percebem que o próprio assédio só é possível na exata medida de sua submissão. Ou seja, além do inegável papel do assediador, encontramos a ausência de ação de um indivíduo ou grupo que deixou de ser AUTOR, de escrever seu roteiro de relações e de batalhar por ele e que, diante do aparecimento de distúrbios psíquicos, limita-se, no máximo, a cobrar na justiça a reparação dos danos morais sofridos. Longe de perceber que sua omissão é um dos elementos fundamentais para o assédio ganhar asas, sua postura continua se recusando a agir diretamente no âmbito do trabalho. O mais comum é que culpe o chefe/supervisor mau caráter e transfira para o advogado a cobrança de uma compensação monetária. Esta opção não só confirma aos patrões que o crime compensa (na medida em que, no Brasil, não mais de 10% dos injustiçados buscam recuperar seus direitos na justiça, sendo que 6% deles farão acordo antes do encerramento do processo), mas, sobretudo reafirma na prática que a realidade da qual é vítima é o resultado de forças externas poderosas e incontroláveis, nunca de sua omissão.
Neste processo, o fato de as desgraças poderem ser sempre atribuídas aos OUTROS, e nunca à falta de ação pessoal, permite aos patrões encolher cada vez mais o campo de autonomia do sujeito e dificultar sobremaneira a preparação de uma resposta coletiva na medida em que nem o indivíduo nem o grupo percebem que as coisas só estão assim porque eles deixam de agir ou atuam somente numa determinada direção. Como funcionário, preciso sempre de alguém para atribuir a culpa da minha condição, pois encontrar um culpado me exime de assumir as responsabilidades que tenho nos acontecimentos e permite atribuir os meus problemas a uma causa externa, sobre a qual, aparentemente, não há o que possa fazer. O que, por sua vez, só reafirma que posso apenas cuidar de mim e nada mais.
Vale ressaltar que as queixas e a busca de um culpado não são criticáveis enquanto tais. Na nossa sociedade são muitíssimos os problemas dos quais se queixar e maior ainda é o número de entidades/pessoas contras as quais apontar o dedo ao formular acusações. A busca de um culpado, porém, torna-se um problema quando o indivíduo se livra de todo senso de responsabilidade pela própria condição e pela degradação das relações sociais ao seu redor. Todos vivemos em circunstâncias sobre as quais temos pouco controle, mas se renunciamos à possibilidade de exercer este mínimo de influência sobre a orientação da vida coletiva corremos o risco de depreciar o sentido da nossa humanidade e tornarmo-nos cada vez mais vítimas de nossa própria omissão.
Isso explica porque, como indivíduo, detesto um sindicato que aponte minhas responsabilidades e aumente minha insegurança ao me colocar frente a frente com a realidade dos fatos. Tudo o que preciso é que forneça um bom advogado, lute por uma justiça ágil, coloque processos de cobrança alheios a qualquer risco para que, reparado o dano sofrido, “EU” possa recuperar minha auto-estima, ser reconhecido e retomar o meu caminho. Como qualquer ser humano, eu, trabalhador da categoria, gosto de acreditar em algo ou alguém porque isso me faz sentir confortável e amparado, e não de me ver como soldado na linha de frente, diante de um inimigo poderoso e com a estranha sensação de virar alvo ao menor deslize que venha cometer. O que quero mesmo é que seja possível ter tudo, ao mesmo tempo, agora e, obviamente, sem riscos! É como se, ao desejar um filho, a condição para iniciar a gravidez fosse a de não lidar com enjôos, não ficar com dores nas costas, não ganhar peso, nem ter aqueles efeitos desagradáveis que costumam aparecer neste período e, obviamente, dar a luz a uma criança saudável que não dê trabalho e nem faça perder uma única noite de sono. A esta altura, o bom senso aconselharia comprar um boneco, mas, para não desagradar, não são poucas as vezes em que se opta por passar a mão na cabeça, por entender e por deixar de colocar as pessoas frente a frente com suas responsabilidades históricas.
Para agradar, para ser vistas como representativas e combativas ou simplesmente para não correr riscos de perder associados, as direções sindicais deixam frequentemente de tratar os trabalhadores como adultos e enveredam por formas de paternalismo tão nefastas quanto às que eram marcada pelo assistencialismo dos velhos pelegos. Por isso, até que ponto a ação sindical consegue construir a dúvida na cabeça de seus representados ao explorar a via do sentimento para recolocar a razão diante da realidade das relações sociais que escapa da percepção do senso comum? Afinal, sabemos “incomodar” o trabalhador ao colocá-lo diante de suas responsabilidades históricas para consigo mesmo e os demais ou a postura do sindicato acaba favorecendo o processo que descrevemos com atitudes e serviços que compensam parcialmente a falta de atuação coletiva, reafirmando as justificativas individuais para a omissão e ocultando o desenvolvimento dos mecanismos de exploração? E, neste processo, estamos conseguindo nos fazer entender ou nossos interlocutores apenas balançam a cabeça à espera de que, terminado nosso discurso, possam voltar a seus afazeres com a sensação de ter perdido o próprio tempo?
(FONTE: PassaPalavra)

TEXTO 02

Trabalho e Emancipação:
Uma análise acerca do Trabalho Feminino no
Capitalismo

Íris Nery do Carmo

Introdução
O foco deste artigo é a condição do trabalho exercido pela mulher, situado no sistema capitalista enquanto sistema produtor de mercadorias, e o que ela representa para o sistema em si em termos de seus pressupostos e princípios. Analisar a condição da atividade produtiva das mulheres, seja ela doméstica ou extra-doméstica, é lançar luz sobre o que a mesma representa para esta sociedade (capitalista) que comumente é descrita apenas como tendo suas bases na acumulação crescente de capital, no trabalho heterônomo e na apropriação da mais-valia - interpretação esta que ignora as relações de gênero, ou tem como pressuposto uma relação simétrica entre os mesmo e portanto não constituinte das relações sociais capitalistas à priori. Tendo em vista que o trabalho assume papel central para o processo de valorização do capital e portanto para a acumulação capitalista, a análise do trabalho exercido pelas mulheres é essencial para que se questione as relações de gênero no universo do sistema produtor de mercadorias. No entanto, o objetivo do artigo não se resume apenas ao trabalho assalariado feminino – que estaria diretamente ligado à produção -, mas também à esfera doméstica, os dois lugares nos quais a presença feminina se fez, mesmo que de forma não unívoca ao longo dos últimos anos. Para tanto foi utilizada pesquisa bibliográfica, principalmente da literatura feminista que diz respeito ao trabalho feminino e análises sobre relações de gênero no capitalismo, como a da alemã Roswitha Scholz.

(continue a leitura na própria revista. faça o download aqui.)






quarta-feira, 23 de março de 2011

Sacco & Vanzetti



A história de dois anarquistas que foram condenados injustamente por assassinato, quando o real motivo foi suas convicções políticas.

IDEIAS PODEM MUITO.
E JAMAIS DEVEMOS NOS CALAR.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Por uma cultura de não violência

Ultimamente, a cidade de Amargosa tem vivido uma verdadeira intensificação da violência no espaço público. E, de repente, todos os moradores passam a desejar segurança pública. Claro, agora o cidadão amargoense pode perder o seu celular, a sua carteira ou, talvez, a sua vida ao andar pelas ruas mortas e escuras da cidade.

Dado o clima de hostilidade, a população que reclama pelo direito do cidadão andar livre pelas ruas, deseja apressadamente que se faça "justiça": o chamado "saneamento". A segura pública se efetivando na "polícia que mata". O Estado garante a vida de alguns tirando a de outros. Não seríamos todos iguais? Todos cidadãos? "Liberdade, Igualdade e Propriedade!".

Não compartilho da oposição estanque entre "Estado opressor", perpetrador da violência, e "comunidade vitimizada", quando falamos, por exemplo, da questão do tráfico de drogas - bastante presente na cidade. Mas, também não compartilho da ideia de que o Estado representa o bem e, portanto, deve exterminar o mal das favelas e comunidades periféricas.

Esta violência urbana que amedronta a todos de Amargosa, é uma violência estrutural. É do mesmo tipo daquela dos grandes centros urbanos. O seu cancro não está no caráter das pessoas das comunidades periféricas - falta Imaginação Sociológica e perspicácia a quem pensa o contrário. Estamos, todos, cegos. Tal violência é fruto, principalmente, da desigualdade social.

Em uma entrevista publicada no jornal Zero Hora, em novembro do ano passado, o ex-chefe da polícia civil do Rio de Janeiro, Hélio Luz, ao discorrer sobre o tráfico no Complexo do Alemão diz algo que nos é válido:

Qual foi o momento em que o Estado perdeu o controle da situação? O Estado nunca teve uma política de segurança a longo prazo. Nem de médio prazo. O Estado sempre operou com política de segurança de resultados. Há duas causas para o que nós estamos vendo. Uma, mais remota, e mais grave, que é a questão social. Outra, mais próxima, é restrita à área de segurança pública.

A impressão é que se trata de um grupo organizado. Quando ocorre esta ação espetacular, você pensa que o Estado venceu e que nós estamos derrotando um inimigo. Mas eles não são inimigos do Estado, eles são integrantes do Estado, mas foram marginalizados. O Estado criou estes caras. É produto direto do que nós fizemos. (...)

O Estado se desresponsabiliza socialmente. Nas comunidades pobres dificilmente você encontra educação escolar de qualidade, por exemplo. Sem falar da falta de assistência médica, dever constitucional do Estado, e da carência de um outro tipo de saneamento, o saneamento básico. Básico e fundamental para a dignidade material do ser humano.

Tomados pelo consumo, quando vamos ao comércio da cidade raramente conseguimos enxergar a violência  que ali se perpetua às Leis Trabalhistas. Ocasionalmente enxergamos a violência doméstica - o cidadão caminha nas ruas. Aplaudimos o progresso econômico, o salário que sai na data prevista, mas fazemos vistas grossas à concentração de renda.  

No mundo capitalista, ser cidadão se confunde com o poder de consumir. Todas as nossas relações são perpassadas pelo capital. A economia capitalista empobrece todas as dimensões das nossas vidas, transformando as relações humanas em mercadorias e massificando um ethos.

Não me surpreende que o egoísmo e a ganância sejam tão recorrentes em uma sociedade que tem sua base no acúmulo de riquezas. E não me surpreende o fato de tanta ganância redundar em violência - dos mais diversos tipos.

Estamos vivendo uma cultura de guerra, de violência. O que precisamos de imediato não é de mais mortes. O que precisamos de imediato é superarmos as nossas relações sociais pautadas em valores que não são humanos. Precisamos cultivar a solidariedade. E o desejo de uma mudança radical.